Sabores, odores e toxinas de algas em recursos de água potável

  • Sabor, odor e aparência são as três características principais que os consumidores utilizam para avaliar a qualidade, a segurança e a aceitabilidade da água potável e dos produtos aquáticos.
  • Além disso, o fenômeno global do aumento da salinidade da água doce pode afetar a qualidade, o sabor e o uso da água para consumo humano e outras atividades.
  • Por outro lado, a tecnologia avança rapidamente na detecção e tratamento de sabores e odores (T&O, Tastings & Odorants), bem como na identificação de células de algas e cianobactérias. Também melhora a compreensão da percepção sensorial dos consumidores, contribuindo assim para um melhor serviço de água potável e para a preservação do meio ambiente.

Relação entre o TDS e o gosto das pessoas pela água potável

O total de sólidos dissolvidos (TDS), que mede o conteúdo mineral da água potável e constitui um recurso essencial para a vida, é um fator chave para determinar se o sabor é agradável para os consumidores.

No entanto, os níveis de TDS que influenciam o gosto variam de acordo com a pessoa, a população e a região. Um intervalo típico está entre 100 e 350 mg/L de TDS.

A dessalinização da água por meio de tecnologias de tratamento por membrana busca atingir um nível de TDS aceitável para o consumo humano e apetecível para os consumidores.

Pesquisas recentes demonstram que, quando o TDS muda em torno de 150 mg/L, os consumidores podem perceber uma diferença na palatabilidade. Portanto, é essencial compreender que um nível de TDS “agradável” ou “aceitável” é variável.

Os consumidores avaliam as mudanças de sabor em relação à qualidade da água que costumam beber em sua casa ou comunidade. Embora o TDS global seja o fator determinante mais importante do sabor, alguns íons específicos podem influenciar de forma positiva — como Ca²⁺, SO₄²⁻ ou HCO₃⁻ — ou negativa — como um excesso de Na⁺, Cl⁻ ou CO₃²⁻.

Presença de odores e desafios para a água potável

A identificação e o controle de odores químicos têm sido, há muito tempo, grandes desafios para manter a qualidade, o saneamento e a segurança da água potável em todo o mundo.

Recentemente, a China realizou uma pesquisa sobre a contaminação por odorantes em 111 estações de tratamento de água potável em todo o país. Os resultados mostraram que mais de 80% da água de origem apresentava problemas de odor. Esses odores eram descritos como terrosos ou mofados (41%) e como pantanosos ou sépticos (36%).

Em geral, a água de lagos e represas apresentava mais odores derivados de algas, enquanto a proveniente de rios tinha mais odores de origem antropogênica.

Posteriormente, entre 2015 e 2018, foram investigados 100 incidentes estéticos em 140 estações de tratamento de 32 cidades. Nessas estações, foram detectados 87 compostos odoríferos na água bruta e 85 na água tratada, com concentrações que variavam de níveis neutros a milhares de ng/L.

Na China, o 2-MIB foi identificado como a substância responsável pelo odor a mofo ou terra, enquanto o dimetil dissulfeto foi a principal causa dos odores pantanosos ou sépticos.

O rio Huangpu, perto de Xangai, enfrenta há muito tempo um problema complexo de odores, incluindo aromas a peixe, solventes e compostos sépticos. Os produtos químicos que geralmente causam esses odores são o 2-MIB, a geosmina, o dimetil dissulfeto e outros compostos semelhantes.

Além disso, descobriu-se a coocorrência de alguns acetais cíclicos possivelmente ligados às indústrias de resinas. Esses compostos também podem contribuir para o odor químico ou séptico da água do rio Huangpu.

Além dos incidentes registrados na China, eventos semelhantes também foram relatados em outras partes do mundo, como o rio Llobregat e Barcelona (Espanha) ou na Virgínia (Estados Unidos).

Efeitos potenciais da salinização da água doce nos sabores, odores e presença de algas

A salinização da água doce e a palatabilidade da água potável representam um desafio global para a sustentabilidade do setor hídrico no século XXI. Esse fenômeno, que implica o aumento da condutância específica, dos TDS, dos cátions e dos ânions nas águas superficiais e subterrâneas, afeta tanto a qualidade quanto a disponibilidade do recurso, impactando a obtenção e o abastecimento de água potável.

Consequentemente, a salinização pode alterar o sabor da água potável e modificar o equilíbrio ecológico das massas de água na superfície e no solo, impactando diretamente os ecossistemas, o meio ambiente e a saúde pública.

A salinização tem múltiplas causas. Por exemplo, alterações nos caudais fluviais, aumento do nível do mar, marés de tempestade, intrusão salina, irrigação agrícola, deterioração das infraestruturas, mudanças climáticas e falta de critérios adequados na gestão da água são alguns fatores que contribuem para esse processo.

Como resultado, a salinização complica o fornecimento de água potável segura e de sabor agradável, afetando também a higiene e o bem-estar das comunidades e aumentando o risco de doenças relacionadas ao consumo de água contaminada.

Ainda não se sabe exatamente em que ponto os consumidores notam uma mudança no sabor mineral da água. No entanto, esse limiar depende do tipo de íons presentes, da fonte da água e do grupo de consumidores, bem como das situações específicas de consumo.

Por esse motivo, o gerenciamento dos minerais dissolvidos que compõem os TDS exigirá tecnologias de membrana mais avançadas e caras, além de educação e controle adequados para garantir a qualidade da água potável para milhões de pessoas.

Monitoramento biomolecular de cianobactérias produtoras de cianotoxinas e substâncias químicas que produzem sabores e odores (T&O)

As cianobactérias que geram cianotoxinas e compostos T&O são geralmente quantificadas por meio de identificação taxonômica e contagem celular com microscopia. Este método é utilizado para garantir a qualidade da água de origem e produzir água potável segura.

No entanto, embora a microscopia permita identificar organismos até o nível da espécie, ela requer profissionais especializados e não consegue distinguir entre aqueles que produzem toxinas ou T&O e aqueles que não produzem.

Por esse motivo, a indústria da água adotou técnicas mais avançadas, como a quantificação de ficocianina e clorofila-a por meio de sondas de fluorescência em linha. Mesmo assim, como as cianobactérias nem sempre são classificadas por espécie, esses métodos oferecem informações limitadas sobre os verdadeiros produtores de toxinas.

Recentemente, técnicas biomoleculares como a reação em cadeia da polimerase quantitativa (qPCR) têm sido utilizadas para quantificar cianobactérias e actinomicetos produtores de toxinas e odores em lagos, represas e tanques de piscicultura.

Esses estudos, realizados na Austrália, China, Japão, Coreia do Sul, Filipinas, Taiwan e outros países, baseiam-se na detecção de genes funcionais responsáveis por metabólitos como a geosmina. As abundâncias genéticas estão correlacionadas com as concentrações observadas de metabólitos, cianotoxinas e compostos T&O.

Um estudo desenvolvido entre 2012 e 2016 demonstrou que as técnicas de monitoramento biomolecular podem ser utilizadas como alternativa às ferramentas tradicionais de gestão de riscos para compostos T&O e cianotoxinas em fontes de água potável.

Técnicas sensoriais no meio aquático

Embora a análise sensorial tenha uma longa trajetória na indústria de alimentos e bebidas, incluindo a aquicultura, sua aplicação na indústria de água potável é relativamente recente.

A análise do perfil de sabor (FPA, Flavor Profile Analysis) é o método descritivo mais utilizado. Nela, um painel de juízes identifica as características organolépticas das amostras de água e as classifica de acordo com a roda T&O, que inclui descritores de odor, sabor e sensações na boca.

O número limiar de odor (TON, Threshold Odor Number) baseia-se na diluição repetida de uma amostra de água até que o odor desapareça e o sabor pareça neutro. Graças à sua simplicidade, o TON continua a ser a técnica de referência na maioria das normas, embora a sua utilidade e fundamentos teóricos tenham sido amplamente debatidos.

Outras técnicas aplicadas na indústria da água potável incluem a análise de classificação de sabores (FRA, Flavor Rating Analysis), a intensidade total do odor (TIO, Total Intensity of Odor) e o teste de classificação de atributos (ART, Attribute Rating Test).

De acordo com o conteúdo mineral da água e outras características, também são utilizados testes estéticos para avaliar sua atratividade, considerando fatores como temperatura, nível de desinfetante ou matéria orgânica.

Da mesma forma, os testes diferenciais são muito úteis para determinar se os consumidores podem detectar mudanças entre diferentes fontes ou tratamentos de água.

Desafios futuros e alternativas

A detecção, identificação e quantificação de toxinas, odorantes e cianotoxinas em concentrações que variam de ng/L a mg/L continuarão sendo um desafio importante para a indústria de água potável. Além disso, o intercâmbio de dados entre acadêmicos e profissionais será fundamental para garantir a segurança e a saúde pública.

Em 2021, Devi et al. criaram um banco de dados abrangente chamado CyanoGM Explorer, que coleta informações sobre eventos de T&O e cianobactérias. O setor de água pode usar essa ferramenta para consultar e atualizar dados sobre produtores de cianobactérias, sua distribuição geográfica e frequência, o que contribui para o desenvolvimento sustentável e a melhoria do serviço.

Por outro lado, a vigilância de odorantes orgânicos continua sendo um campo em constante inovação. As técnicas analíticas mais eficazes para identificar as substâncias responsáveis pelos odores são a Cromatografia Gasosa Bidimensional Completa – Espectrometria de Massa de Tempo de Voo (GC×GC-MS) e a Cromatografia Gasosa – Espectrometria de Massa de Tempo de Voo Quadrupolo (GC-Q-TOF/MS).

Além disso, existe uma necessidade urgente de desenvolver ferramentas analíticas in situ mais precisas, como biossensores olfativos ou narizes eletrônicos com maior estabilidade e seletividade.

A coocorrência de diferentes odorantes pode intensificar a percepção do odor nos consumidores, uma vez que as combinações químicas podem gerar efeitos sinérgicos ou antagônicos.

Para controlar melhor os eventos de odor, é essencial localizar a fonte contaminante e criar um banco de dados com as impressões químicas dos compostos responsáveis.

Por fim, a coleta de respostas e emoções não verbais dos consumidores. Por exemplo, a análise facial ou a pupilometria são cada vez mais utilizadas na indústria de alimentos e bebidas. Essa abordagem também poderia ser aplicada ao setor de água potável como método alternativo para avaliar a aceitabilidade do produto.